terça-feira, 14 de abril de 2015

Até o Fim - Chico Buarque e Ney Matogrosso - Intertextualidade




Até o Fim (Chico Buarque)
Quando nasci veio um anjo safado
O chato “dum" querubim
E decretou que eu estava predestinado
A ser errado assim

Já de saída a minha estrada entortou
Mas vou até o fim
"inda" garoto deixei de ir à escola
Cassaram meu boletim

Não sou ladrão, eu não sou bom de bola
Nem posso ouvir clarim
Um bom futuro é o que jamais me esperou
Mas vou até o fim

Eu bem que tenho ensaiado um progresso
Virei cantor de festim
Mamãe contou que eu faço um bruto sucesso
Em Quixeramobim
Não sei como o maracatu começou
Mas vou até o fim

Por conta de umas questões paralelas
Quebraram meu bandolim
Não querem mais ouvir as minhas mazelas
E a minha voz chinfrim
Criei barriga, a minha mula empacou
Mas vou até o fim

Não tem cigarro acabou minha renda
Deu praga no meu capim
Minha mulher fugiu com o dono da venda
O que será de mim?
Eu já nem lembro "pronde" mesmo que eu vou
Mas vou até o fim


Como já disse era um anjo safado
O chato dum querubim
Que decretou que eu estava predestinado
A ser todo ruim
Já de saída a minha estrada entortou
Mas vou até o fim


INTERTEXTUALIDADE

Poema de Sete Faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus,
                    [pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

(ANDRADE, Carlos Drummond de. Alguma Poesia, 1930)


Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.  Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

PRADO, Adélia. Bagagem. São Paulo: Siciliano. 1993. p. 11





Texto Revista Exame - Intertextualidade - Charlie Hebdo

REVISTA EXAME
MUNDO  07/01/2015 16:03

As capas de Charlie Hebdo que causaram a ira em extremistas

Cartunista do Charlie Hebdo segura uma capa do jornal
São Paulo – O jornal semanal francês Charlie Hebdo é conhecido por suas charges ácidas e irreverentes. E também pelo tom provocativo com o qual trata de diferentes temas, como religião e política.
A publicação descende de uma revista satírica publicada nos anos 60, chamada “Hara Kiri”. Esta última teve sua circulação banida em 1970 por conta de uma capa que tratava da morte do então presidente francês Charles de Gaulle e que foi considerada ofensiva pelo governo.
Em 1981, Charlie Hebdo encerrou suas atividades, mas foi reaberto cerca de dez anos depois. Já em 2006, ganhou notoriedade ao publicar as famosas charges de Maomé produzidas por um jornal dinamarquês e que fizeram eclodir protestos da comunidade muçulmana em todo o planeta.
O jornal foi processado, mas não condenado, e ganhou um puxão de orelha do presidente do país na época Jaques Chirac. A publicação respondeu ao chamado do governo com uma carta assinada por jornalistas, escritores e intelectuais que se posicionaram contra o extremismo religioso.
Pouco depois, em 2011, a sede do jornal foi alvo de um atentado terrorista logo no dia seguinte à publicação de uma capa que novamente retratava Maomé e dizia “cem chibatadas se você não estiver morto de rir. ” Naquela edição, o jornal mudou o nome para “Charia Hebdo”, numa brincadeira com a palavra “sharia”*, nome que se dá para as leis islâmicas.
No ano seguinte, outra capa de Charlie Hebdo causou a ira dos extremistas e fez com que a França decidisse por fechar embaixadas e escolas francesas espalhadas pelo mundo.
No calor causado pelo filme “A inocência dos muçulmanos”, o jornal publicou uma charge na qual mostrava um muçulmano sendo empurrado em uma cadeira de rodas por um judeu ortodoxo.
“Nosso objetivo é fazer rir”, contou para a revista The New Yorker Laurent Léger, um dos jornalistas de Charlie Hebdo. “Queremos rir dos extremistas, sejam eles muçulmanos, judeus ou católicos. Todo mundo pode ser religioso, mas não podemos aceitar atos extremistas”, disse ele.

*A charia é o corpo da lei religiosa islâmica. O termo significa "caminho" ou "rota para a fonte de água", e é a estrutura legal dentro do qual os aspectos públicos e privados da vida do adepto do islamismo são regulados, para aqueles que vivem sob um sistema legal baseado na fiqh (os princípios islâmicos da jurisprudência) e para os muçulmanos que vivam fora do seu domínio. A charia lida com diversos aspectos da vida cotidiana, bem como a política, economia, bancos, negócios, contratos, família, sexualidade, higiene equestões sociais.

O termo charia deriva do verbo árabe "shara'a" (em árabe: شرع), que está ligado à ideia de um "sistema de lei divina", um "caminho de crença e prática" (Corão 45:18). ( gr

Ao Cubo - Põe na Conta (Versão Oficial)



Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=59vHSr_ll0c> . Acesso: 12/04/15

Põe Na Conta (Ao Cubo)

O Progresso um dia vem, mas no outro ele some
O desejo de consumo pode ser que te devore
Você é o que “cê” come, é o que consome

O país produz mais visando seu descontrole
Depois de um I-Phone e um Plasma gigante
Vai se sentir melhor, se sentir mais importante
Tudo aos seus pés, compre e pague em 10
Cuidado no final pode dar um "revertréz"

Junta muitos bens, muito mais do que precisa
Se muito é dado, é cobrado em seguida
Guarde seu tesouro onde ladrão não o alcance
Onde a traça não corrói, e está sempre em segurança

A loja quer vender, o comércio quer freguês
Então enche a sacola e compra logo de uma vez
Estoura o limite aciona outra bomba
Passa o borrachudo ou então põe na conta
Põe na conta, põe na conta
Põe na conta, põe na conta
Faz muito bem “pra” mim comprar no shopping
Põe na conta, põe na conta
Põe na conta, põe na conta
Faz muito bem “pra mim” gastar meu “dim-dim”
“Os menino” tão tudo “aê”, gastando o que não tem “pra’ mostrar “pro cês”
Compra um tênis compra moto “pro rolê”
São 60 prestação vai com calma “aê”
Eu quero isso e aquilo que eu vi na TV
Se o mano na escola tem eu também quero ter

O "manhe" compra “pra” mim que eu prometo ser o melhor filho, eu prometo
- Mas eu só tenho você
Olha só óh, digno de dó óh, perdeu o juízo e se for preciso faz algo maior óh
Pra ser o melhor óh, pra ter o que quer né
Bate o Pé
Vai até na vó e ai se ela “num” der e aí quem é que não conhece alguém assim?
Viciado em comprar em gastar diz pra mim
Comprar no shopping e gastar o “dim-dim”
Estourar o cartão até o fim
Põe na conta, põe na conta
Põe na conta, põe na conta
Faz muito bem “pra” mim comprar no shopping
Põe na conta, põe na conta
Põe na conta, põe na conta
Faz muito bem “pra” mim gastar meu “dim-dim’
No fundão de Sampa, todo mundo a pampa
No rasante eletrizante só os firmes lá na banca
“As mina”: - Eu “to” gastando mesmo, o que que tem?
“Os mano”: - Vindo do fundão só “pescoçando”
- O dinheiro é meu hein, eu faço o que quiser neném, deixa eu gastar que me faz bem
- Calma aí
- Que calma? Gasto mesmo com sapato, bolsa cabelo, põe na conta “ta” barato
“Pra” virar manchete “pra bombar” na net, “pra” virar noticia e te jogarem confete

Olha “os pivete” com seus “canivete”, mais desejo mais que acerte até que foi a sete
Quanto mais desejo muito muito mais bandido
Querem o que “cê” tem o que “cê” quer “num” faz sentido
“Pra” muito deprimido shopping é mais que um médico
Toma um chá de loja e passa o cartão de crédito
Põe na conta, põe na conta
Põe na conta, põe na conta
Faz muito bem pra mim comprar no shopping
Põe na conta, põe na conta
Põe na conta, põe na conta
Faz muito bem “pra” mim gastar meu “dim-dim”
Compre mais, compre mais, compre mais




quinta-feira, 9 de abril de 2015

Artigo de Opinião - " Mídia e o culto à beleza do corpo"

Mídia e o culto à beleza do corpo
Há nas sociedades contemporâneas uma intensificação do culto ao corpo, onde os indivíduos experimentam uma crescente preocupação com a imagem e a estética.
Entendida como consumo cultural, a prática do culto ao corpo coloca-se hoje como preocupação geral, que perpassa todas as classes sociais e faixas etárias, apoiada num discurso que ora lança mão da questão estética, ora da preocupação com a saúde.
Segundo Pierre Bourdieu, sociólogo francês, a linguagem corporal é marcadora pela distinção social, que coloca o consumo alimentar, cultural e forma de apresentação – como o vestuário, higiene, cuidados com a beleza etc. – como os mais importantes modos de se distinguir dos demais indivíduos.
Nas sociedades modernas há uma crescente preocupação com o corpo, com a dieta alimentar e o consumo excessivo de cosméticos, impulsionados basicamente pelo processo de massificação das mídias a partir dos anos 1980, onde o corpo ganha mais espaço, principalmente nos meios midiáticos. Não por acaso que foi nesse período que surgiram as duas maiores revistas brasileiras voltados para o tema: “Boa Forma” (1984) e “Corpo a Corpo” (1987).
Contudo, foi o cinema de Hollywood que ajudou a criar novos padrões de aparência e beleza, difundindo novos valores da cultura de consumo e projetando imagens de estilos de vida glamorosos para o mundo inteiro.
Da mesma forma, podemos pensar em relação à televisão, que veicula imagens de corpos perfeitos através dos mais variados formatos de programas, peças publicitárias, novelas, filmes etc. Isso nos leva a pensar que a imagem da “eterna” juventude, associada ao corpo perfeito e ideal, atravessa todas as faixas etárias e classes sociais, compondo de maneiras diferentes diversos estilos de vida. Nesse sentido, as fábricas de imagens como o cinema, televisão, publicidade, revistas etc., têm contribuído para isso.
Os programas de televisão, revistas e jornais têm dedicado espaços em suas programações cada vez maiores para apresentar novidades em setores de cosméticos, de alimentação e vestuário. Propagandas veiculadas nessas mídias estão o tempo todo tentando vender o que não está disponível nas prateleiras: sucesso e felicidade.
O consumismo desenfreado gerado pela mídia em geral foca principalmente adolescentes como alvos principais para as vendas, desenvolvendo modelos de roupas estereotipados, a indústria de cosméticos lançando a cada dia novos cremes e géis redutores para eliminar as “formas indesejáveis” do corpo e a indústria farmacêutica faturando alto com medicamentos que inibem o apetite.
Preocupados com a busca desenfreada da “beleza perfeita” e pela vaidade excessiva, sob influência dos mais variados meios de comunicação, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica apresenta uma estimativa de que cerca de 130 mil crianças e adolescentes submeteram-se no ano de 2009 a operações plásticas.
Evidentemente que a existência de cuidados com o corpo não é exclusividade das sociedades contemporâneas e que devemos ter uma especial atenção para uma boa saúde. No entanto, os cuidados com o corpo não devem ser de forma tão intensa e ditatorial como se tem apresentado nas últimas décadas. Devemos sempre respeitar os limites do nosso corpo e a nós a mesmos.

Orson Camargo
Colaborador do site Brasil Escola
Graduado em Sociologia e Política pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo – FESPSP
Mestre em Sociologia pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP


Disponível em: http://www.brasilescola.com/sociologia/a-influencia-midia-sobre-os-padroes-beleza.htm